por Rafael Lancellote*
No artigo da semana passada falamos sobre como a Epistemologia ou Teoria do Conhecimento costuma ser cobrada nos vestibulares, principalmente no Enem. Nesta semana abordaremos o problema da Ética e seus diversos significados ao longo da história do pensamento e na próxima semana focaremos nos principais filósofos que contribuíram para a consolidação dessa questão e, por essa razão, costumam ser temas de questões nos principais vestibulares do país.
Primeiramente é importante frisar que a palavra “Ética” ganhou vários significados no decorrer da história do pensamento tornando-se necessário contextualizá-la na história da filosofia para melhor compreendê-la.
De maneira geral podemos definir Ética como sendo o estudo dos assuntos morais, do modo de ser e agir dos seres humanos, além dos seus comportamentos e caráter. A ética na filosofia procura descobrir o que motiva cada indivíduo de agir de um determinado jeito, diferencia também o que significa o bom e o mau, e o mal e o bem.
Na filosofia grega clássica, a ética buscava a fundamentação teórica para encontrar o melhor modo de viver e conviver, isto é, a busca do melhor estilo de vida, tanto na vida privada quanto em público. Dessa forma, para os filósofos gregos clássicos, como Sócrates, Platão e Aristóteles, havia uma relação estreita entre a ética e a política, sendo impossível entendê-las de modos independentes. Também é importante compreender que a ética para os gregos significava um processo de ajustamento e harmonização com o todo cósmico, isto é, o comportamento desejado significaria conhecer sua finalidade dentro do cosmos e agir segundo essa finalidade, visando atingir a boa vida para si e para a pólis.
Essa visão de ajustamento aos desígnios cósmicos permanece durante o período medieval, porém não é mais a natureza o “gabarito” para o comportamento humano e sim a vontade de Deus e as virtudes cristãs. Porém a estrutura do pensamento ético permanece o mesmo: a vida boa e o comportamento desejado são ditados por agentes externos ao ser humano, como o cosmos e Deus.
Com o Renascimento e a Revolução Científica, temos uma guinada antropocêntrica, isto é, as explicações acerca do mundo partem do referencial humano e não de agentes metafísicos ou externos. Isso se deve à queda do modelo geocêntrico e à reforma protestante que colocaram em dúvida tanto o cosmos ordenado, finito e relacional dos gregos, quanto a vontade divina dos cristãos, trazendo para a razão humana a ferramenta decisória do que seria a melhor forma de viver e conviver.
Aqui a ética encontra-se com a moral e o foco não é mais o bem viver ou a harmonia com o todo universal e sim da reflexão sobre o valor das ações sociais consideradas tanto no âmbito coletivo como no âmbito individual, ou seja, quais os critérios que fazem com que as ações sejam consideradas moralmente corretas. O auge dessa perspectiva encontra-se no Iluminismo no uso da razão como orientadora da ação correta.
A partir do século XIX surgem diversas críticas ao Iluminismo e à suas premissas. Nomes como Nietzsche, Freud e Marx encabeçam essas críticas e colocam em xeque os valores da modernidade e seus critérios de verdade, certeza e moral. São os precursores da pós-modernidade que trará em seu bojo a suspeição de qualquer valor moral a priori ou absoluto, partindo da relativização das condutas e do bem-estar individual. Essa radicalização do pensamento pós-moderno se deve ao enfraquecimento das estruturas tradicionais como família e religião, trazendo um desconforto aos indivíduos e uma incerteza sobre como determinar suas condutas.
No século XX, buscando compreender as raízes desse mal-estar da civilização pós-moderna, surge o Existencialismo Sartreano lançando um olhar ontológico sobre a condição humana e revelando a falta de um “gabarito” existencial e comportamental para os seres humanos, recaindo sobre nossas escolhas a responsabilidade de toda ação.
Ao final do século XX e às portas do XXI, o avanço tecnológico e científico traz novas formas de socialização e descobertas científicas e, assim, novas questões para o campo da ética como, por exemplo, a bioética, o direito dos animais e a socialização em tempos “líquidos”.
Na próxima semana aprofundaremos os temas da ética trazendo algumas ideias e filósofos essenciais para refletir sobre esse assunto que costuma ser muito cobrado nos principais vestibulares do país. Até mais!
*professor de filosofia e sociologia do Cursinho da Poli