Por Luis Gustavo Reis

O Brasil tem recursos naturais, mas passa fome, é naturalmente rico, mas vive endividado, é negro e mestiço, mas deseja ser europeu”

Abdias do Nascimento

Neste mês celebra-se o “Dia Nacional da Consciência Negra”. É daquelas datas em que um elã emocional entorpece o país e todos parecem comprometidos com uma nação mais justa, fraterna, plural, miscigenada e igualitária. Quanta humanidade em nossos conterrâneos!

Propagandas, seminários, palestras, feiras, shows e até um feriado é dedicado à memória de um dos maiores ícones da história do Brasil, ninguém menos que Zumbi dos Palmares.

Mas o país que exalta sua miscigenação produz gritantes aberrações. Uma delas é a ausência de pretos e pardos em programas televisivos, assim como atuando em determinadas profissões, tais como professores universitários, pilotos de avião, médicos, engenheiros e – pasmem! – até técnicos de futebol. Vale a pergunta, caro leitor: quantos jogadores de futebol pretos você conhece? Agora pense: quantos técnicos de futebol você já viu dirigindo os clubes brasileiros? Estranho, não? Enfim…

Segundo o Censo de 2012, pretos e pardos compõem a maioria da população brasileira. Então, por que é tão difícil encontrar essas pessoas nas profissões citadas acima?

É verdade que o Brasil é um país mestiço, formado pelas valiosas contribuições dos vários povos que aqui se estabeleceram. Todavia, um dado elementar distingue cidadãos e mutila cidadanias. O corpo, a corporeidade! Somos todos mestiços, mas os de tez mais enegrecida sofrem cotidianamente as mazelas do racismo.

Há quem alegue que no Brasil o preconceito é social e não “racial”. Evidente que os pobres, sejam pretos ou brancos, sofrem preconceito no Brasil, mas não há como negar que o preto e o pardo são alvos sistemáticos de piadas, achincalhes, violência e todo tipo de ação veladamente racista disparada por brancos ricos ou pobres. Portanto, equiparar o preconceito econômico ao étnico é, no mínimo, despropositado.

Relatórios produzidos por Instituições (Anistia Internacional, por exemplo) apontam desrespeitos sistemáticos aos direitos humanos da população preta e parda, além de denunciarem rotineiramente agentes da segurança pública como grandes especialistas em assassinar jovens pertencentes a esses grupos nos vários rincões de pobreza deste país.

Dizer que gostamos de nos reconhecer como miscigenados significa varrer o racismo para debaixo do tapete. É esse tipo de pensamento, atrelado ao descaso, à hipocrisia e ao desinteresse nacional em debater seriamente a questão, que situa o Brasil no topo do ranking das nações mais racistas do planeta.

É preciso se debruçar sobre a questão do racismo com seriedade. Celebrar o 20 de novembro, desfrutar do feriado (em algumas regiões), postar mensagens nas mídias sociais, dizer que tem amigos pretos e pardos, mas descuidar do problema nos demais dias do ano é de uma insensibilidade atroz. Ou mudamos nossas atitudes cotidianamente para construir um país mais justo, plural e fraterno ou estaremos girando em falso, atados a essas conhecidas hipocrisias.


Cursinho da Poli

Author Cursinho da Poli

More posts by Cursinho da Poli

Leave a Reply