Texto de Rafael Lancellote*
Zygmunt Bauman nasceu em 1925 na Polônia e tornou-se referência obrigatória para as ciências humanas devido a sua enorme contribuição para a compreensão daquilo que se convencionou chamar de pós-modernidade. Autor de extensa bibliografia, permaneceu ativo e lecionando como professor titular da Universidade de Leeds, na Inglaterra. Intelectual premiado e laureado diversas vezes, Bauman faz parte da galeria dos gênios que contribuíram radicalmente com a compreensão da realidade social de seu tempo.
Criador do conceito de “Modernidade Líquida”, Bauman forneceu o instrumental definitivo de interpretação das relações sociais predominantes a partir de meados do século XX. Ao ponto de, atrevo-me a dizer, ser impossível estabelecer qualquer compreensão de fenômenos sociais contemporâneos sem lançar mão de alguma de suas “liquidezas”.
Em época de universalização das redes sociais e extrema velocidade do fluxo de informações e capitais, Bauman nos ajuda a compreender o esfacelamento de estruturas ideológicas construídas e muito valorizadas pela humanidade e que, durante a “época moderna” (século XVI ao início do XX) tiveram seu apogeu calcado na crença inabalável do poder da razão humana e do conhecimento científico. O que mudou foi a “modernidade sólida”, que cessa de existir, e, em seu lugar, surge a “modernidade líquida”. A primeira seria justamente a que tem início com as transformações clássicas e o advento de um conjunto estável de valores e modos de vida cultural e político. Na modernidade líquida, tudo é volátil, as relações humanas não são mais tangíveis e a vida em conjunto, familiar, de casais, de grupos de amigos, de afinidades políticas e assim por diante, perde consistência e estabilidade.
Assim sendo, a condição do homem pós-moderno é de insegurança, pois o ideal de sujeito moldado pela “modernidade sólida” deixa de existir, sobrando aquilo que Bauman descreve como “O Mal Estar da Pós-Modernidade”, título de uma de suas obras. Neste livro, Bauman tem o intuito de mostrar que a marca da pós-modernidade – ou seu valor supremo – é a ‘vontade de liberdade’ que acompanha a velocidade das mudanças econômicas, tecnológicas, culturais e do cotidiano. Daí resulta um mundo vivido como incerto, incontrolável e assustador – bem diverso da segurança projetada em torno de uma vida social estável, ou em torno da ordem, como queriam os iluministas do século XVIII.
Zygmunt Bauman deixa um legado brilhante para as ciências humanas e para todos aqueles que se interessam pela compreensão das relações sociais e da complexidade que constitui o ser humano. Ao lado de nomes como Jürgen Habermas e Slavoj Žižek, Bauman contribuiu com a gramática necessária para a leitura dos nossos tempos e deixa a semente para novos intelectuais desenvolverem suas ideias. Só nos resta agradecer e desejar um merecido descanso a esse vigoroso intelectual e incomparável mestre.
*Rafael Lancellote é professor de Filosofia e Sociologia do Cursinho da Poli